24 de jan. de 2005

Balanço Renovado








Esta foi minha primeira matéria com chamada de capa em uma edição de Domingo, no Estadão.



 CASA&
 23/01/2005

Balanço Renovado

Sinônimo de conforto e aconchego, a cadeira
de balanço tem história (e desenho) instigantes

Reportagem Juliana Tourrucôo
Produção  M. Regina Notolini
Fotos Marcos Mendes


Palha, plástico, fibra de vidro, ferro, aço ou inúmeros tipos de madeira. A extensa lista de materiais já utilizados para compor os mais inusitadosmodelos de cadeira de balanço dá conta de que essa é uma peça de decoração que tem história. Seu início é incerto. Alguns afirmam que os primeiros modelos surgiram no século 16; outros, no 17. A autoria também gera discussões. Pode ter nascido na Inglaterra ou nos Estados Unidos. Tanto faz: quem teve a idéia de criá-la jamais poderia imaginar o impacto que o invento
causou através dos tempos.

Arquitetos como o casal Charles e Ray Eames e Oscar Niemeyer, incluindo os pintores Edvard Munch, em 1884, e Pablo Picasso, em 1943, e alcançando os escritores, entre eles, Carlos Drummond de Andrade, todos os artistas têm uma espécie de “rocking chair”, como é chamada em inglês, marcada na sua
obra.


Na história de cadeira de balanço, segundo o professor de Desenho Industrial da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, João Bezerra, é importantíssimo acompanhar a saga de Michel Thoner, marceneiro alemão realmente visionário, que desenvolveu a técnica da madeira vergada e a patenteou em 1841 (hoje é mundialmente difundida pela marca Thonart). Segundo o livro sobre a história da família Thoner, a experiência com a cadeira de balanço só seria iniciada em 1860. Nesse momento, Thoner já tinha o aparato industrial necessário para a fabricação do móvel em série. E, como a técnica da madeira vergada se encaixou perfeitamente ao conceito de cadeira de balanço, seu criador foi ao êxtase, inventando inúmeras
possibilidades de balanço. Do curto, ideal para lugares de pouco espaço, ao tradicional vaivem. Em um período, a cadeira chegou ao limiar de tornar cama de balanço. O requinte era tamanho que alguns modelos permitiam esticar as pernas (ou apenas os pés).

Na página ao lado, uma Thonart em madeira envergada (R$ 849, na L’Oeil). Acima, o modelo de Niemeyer ( à venda, na Casa On). Sem braços, a peça de 1930 (R$ 750,00, na Maria Jovem). Em forma de concha, a Eames (R$ 850, na Maria Jovem). A de traço moderno é de Carlos Motta (R$ 2.940)

Segundo o professor João Bezerra, mesmo com o lançamento desses modelos preferencialmente horizontais, muitos se mantinham fiéis às cadeiras de balanço que deixassem a postura ereta. “Isso porque a pessoa, além de poder balançar, aproveitava para fazer alguma outra coisa, como amamentar o filho”, explica. E é justamente essa riqueza de funções que deve nortear a escolha de quem pretende adquirir uma cadeira de balanço. “Tudo vai depender para qual propósito ela será usada”, diz. Como acontece desde sua criação, as cadeiras são moldadas por designers e arquitetos. E diversidade de modelos é o que não falta. Aos indecisos, seguem algumas dicas. “O modelo do casal Charles e Ray Eames fica muito bem em ambientes contemporâneos”, avalia o arquiteto Fábio Galeazzo, que sempre usa essa peça em seus projetos de decoração de interiores. Segundo ele, quando o cliente pede uma decoração mais despojada, mas que mantenha um quê conservador, deve optar por uma poltrona estofada. “Em uma casa de campo ou no ambiente familiar, uma Thonet cai superbem”, opina. Galeazzo lembra que o hábito de ter cadeira de balanço se mantém “porque o balançar remete a memórias infantis, como a da casa da avó ou do movimento feito pela mãe para fazer o filho dormir”.

Por várias vezes, o escritor Carlos Drummond de Andrade demonstrou seu afeto e gratidão à cadeira e ao seu balanço. “Esta minha cadeira de balanço austríaca é mineira legítima. Mineiro é o balanceio calmo que ela imprime ao corpo, às idéias, aos sonhos. Não dá para adormecer. Favorece o estado contemplativo-meditativo, isento de ambição, de amargura e de pressa.Símbolo de bem-estar doméstico, um dos móveis mais graciosos inventados pelo homem, a cadeira de balanço convém particularmente ao cronista, que não é provocador de fatos, mas é espelho deles (...).” Esse texto foi publicado na contracapa do seu livro, Cadeira de Balanço, em 1966. A homenagem a esse objeto também seria prestada na escolha do nome do programa de rádio que então mantinha na PRA-2, rádio do Ministério da Educação.

Não tão admirador quanto Drummond, Niemeyer, em parceria com a filha Anna Maria, projetou uma cadeira de balanço em 1977. “Na verdade, foi ele quem fez, apenas ajudei nos detalhes mais burocráticos”, ressalva Anna Maria. A cadeira, assim como outros nove móveis assinados pela dupla, passaram a ser
vendidos na Casa On, em uma loja exclusiva para produtos Niemeyer, no ano passado. Sua produção continua a ser em jacarandá, com detalhes em palha. A diferença é que agora elas aparecem com numeração de série e certificado – afinal, a família Niemeyer tenciona acompanhar o paradeiro de cada peça. O preço: R$ 15 mil.


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